fevereiro 19, 2011




quando vou começar a escrever, leio Clarice e desisto

(…)
E é inútil procurar encurtar caminho e querer começar, já sabendo que a voz diz pouco, já começando por ser despessoal. Pois existe a trajectória, e a trajectória não é apenas um modo de ir. A trajectória somos nós mesmos. Em matéria de viver nunca se pode chegar antes. A via-crucis não é um descaminho, é a passagem única, não se chega senão através dela e com ela. A insistência é o nosso esforço, a desistência é o prémio. A este só se chega quando se experimentou o poder de construir, e, apesar do gosto de poder, prefere-se a desistência. A desistência tem que ser uma escolha. Desistir é a escolha mais sagrada de uma vida. Desistir é o verdadeiro instante humano. E só esta é a gloria própria da minha condição.
A desistência é uma revelação.
(Clarice Lispector, A Paixão Segundo G.H., pag.142, Relógio D'Água)







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