Muita coisa se poderia fazer em favor da poesia:
a – Esfregar pedras na paisagem.
b – Perder a inteligência das coisas para vê-las.
c – Esconder-se por trás das palavras para mostrar-se.
d – Mesmo sem fome, comer as botas. O resto em Carlitos.
e – Perguntar distraído: - o que há de você na água?
f – Não usar colarinho duro. A fala de furnas brenhentas de Mário-pega-sapo era nua. Por isso as crianças e as putas entendiam-no.
g – Nos versos mais transparentes enfiar pregos sujos, teréns de rua e de música, cisco de olho, moscas de pensão.
h – Aprender a capinar com enxada cega.
i – Num dia de lazer, compor um muro podre para os caramujos.
j – Deixar os substantivos passarem anos no esterco, deitados de barriga, até que eles possam carrear para o poema um gosto de chão – como cabelos desfeitos no chão – ou como o bule de Braque – áspero de ferrugem, mistura de azuis e ouro – um amarelo grosse de ouro na terra, carvão de folhas.
l – Jogar pedrinhas nim moscas...
(Manoel de Barros, “Matéria de Poesia”, Record)
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