julho 06, 2011





5. A história de Ad


A história de Ad/Gabi figura bem este desejo de mostração das coisas - "queria ver Deus" - e o seu diferimento para o encontro no rosto do outro. É preciso deixar de o pensar, colocando o coração na proximidade da sua paisagem. A lição do rosto é que a única epifania que nos é dado sentir exige a "boa distância", dado o perigo de fanatismo que o ponto-voraz desencadeia nos humanos. Manter-se numa proximidade tensa diante do Tesouro escondido, é essa a posição mística. A crença na existência de outros seres humanos como tais, é o amor. O rosto testemunha disso enigmaticamente. Como admiravelmente escreve F. Jacques: "O rosto vive à medida em que o olhar ou a palavra se fazem recíprocas, que nele encontramos as marcas da aquiescência, da disponibilidade, da interrogação". A carga relacional do rosto faz dele um bom mensageiro. Onde está a fonte da existência do rosto ao assalto da hipocrisia? Não está ela não apenas no facto que o rosto revela a presença da alteridade radical, o outro na sua passividade, "no limite do sem-defesa" (Levinas) mas sobretudo que o face a face manifesta um carácter imediatamente relacional? A reciprocidade interpessoal não nos leva directamente, sem "intermediação", do criado ao criador, descrevendo o rosto humano por similitude com aquilo que se pressente da face divina - que ninguém poderia ver sem morrer (Ex. 33, 30). Nem o apelo de Deus se confunde com o apelo do homem. (...) Mas a imagem permite o apelo e a relação, como cena fulgor. MGL recusa fundamentalmente que se fale do acesso à alteridade a partir das condições da representação. Recusa fazer de outrém um objecto segundo o modelo óptico da fenomelogia, perferindo o caminho da cena-fulgor e do inter-corpo com todos os riscos que comporta a sua aproximação e a sua prática. A proximidade do ponto de não-humanidade e da Presença comportam riscos iguais. Mas o risco maior é a incandescência dos códigos que se cruzam sem que as pessoas se toquem.(...)

(josé augusto mourão, "O FULGOR É MÓVEL - em torno da obra de maria gabriela llansol")



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